quarta-feira, 30 de maio de 2012

Conselho de Direitos Humanos da ONU recomenda fim da Polícia Militar no Brasil


O Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) pediu nesta quarta-feira ao Brasil maiores esforços para combater a atividade dos "esquadrões da morte" e que trabalhe para suprimir a Polícia Militar, acusada de numerosas execuções extrajudiciais.

Esta é uma de 170 recomendações que os membros do Conselho de Direitos Humanos aprovaram hoje como parte do relatório elaborado pelo Grupo de Trabalho sobre o Exame Periódico Universal (EPU) do Brasil, uma avaliação à qual se submetem todos os países.

A recomendação em favor da supressão da PM foi obra da Dinamarca, que pede a abolição do "sistema separado de Polícia Militar, aplicando medidas mais eficazes (...) para reduzir a incidência de execuções extrajudiciais".

A Coreia do Sul falou diretamente de "esquadrões da morte" e a Austrália sugeriu a Brasília que outros governos estaduais "considerem aplicar programas similares aos da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) criada no Rio de Janeiro".

Já a Espanha solicitou a "revisão dos programas de formação em direitos humanos para as forças de segurança, insistindo no uso da força de acordo com os critérios de necessidade e de proporcionalidade, e pondo fim às execuções extrajudiciais".

Pedido de investigação 

O relatório destaca a importância de que o Brasil garanta que todos os crimes cometidos por agentes da ordem sejam investigados de maneira independente e que se combata a impunidade dos crimes cometidos contra juízes e ativistas de direitos humanos.

O Paraguai recomendou ao País "seguir trabalhando no fortalecimento do processo de busca da verdade" e a Argentina quer novos "esforços para garantir o direito à verdade às vítimas de graves violações dos direitos humanos e a suas famílias".

A França, por sua parte, quer garantias para que "a Comissão da Verdade criada em novembro de 2011 seja provida dos recursos necessários para reconhecer o direito das vítimas à justiça".
Reforma no sistema penitenciário 

Muitas das delegações que participaram do exame ao Brasil concordaram também nas recomendações em favor de uma melhoria das condições penitenciárias, sobretudo no caso das mulheres, que são vítimas de novos abusos quando estão presas.

Neste sentido, recomendaram "reformar o sistema penitenciário para reduzir o nível de superlotação e melhorar as condições de vida das pessoas privadas de liberdade".

Olhando mais adiante, o Canadá pediu garantias para que a reestruturação urbana visando à Copa do Mundo de 2014 e aos Jogos Olímpicos de 2016 "seja devidamente regulada para prevenir deslocamentos e despejos".

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Memórias de um estádio de repressão

Por Lívia Neder, do Globo


Prisão durante a ditadura, Caio Martins será palco de cerimônia de reparação a 120 acusados de crimes políticos em 1964

O advogado Manoel Martins volta ao local onde ficou preso, em 1964, durante a ditadura militar


Cenário de diversos campeonatos esportivos, o Complexo Esportivo Caio Martins, em Icaraí, também foi palco de tristes episódios por certo período da História brasileira. O local serviu de prisão política logo após o golpe militar, em 1964, mas, no dia 4 de junho, sediará uma cerimônia de reparação a presos políticos vítimas da ditadura, promovida pelo governo estadual. A presidente Dilma Rousseff integra lista de 120 pessoas que receberão cartas com pedido de desculpas do governador Sérgio Cabral, mas ainda não confirmou presença.

O advogado Manoel Martins, de 88 anos, sentiu na pele a repressão do regime militar em solo niteroiense. Ele foi um dos últimos presos a deixar o Caio Martins, em julho de 1964. De acordo com seus relatos, no começo da prisão — em abril daquele ano — houve um pico de mais de 600 prisões e, ao longo de seus três meses de cárcere, cerca de 1.200 pessoas passaram por lá.

— Fui preso no dia 9 abril de 1964, após meu escritório, na Avenida Amaral Peixoto, ter sido devassado, assim como muitos lares em Niterói. Na época, eu era militante comunista e advogado dos principais sindicatos do estado. Depois de passar pelo reduto de repressão da Marinha, na Ponta d’ Areia, e pelo Departamento de Ordem Política e Social, o Dops, fui levado com meus companheiros, no dia 20, para o Caio Martins, que estava abarrotado de gente. Todos os dias chegavam caminhões lotados de presos. As condições eram desumanas. Fomos submetidos a todo tipo de humilhação.

Retornar ao local ainda é difícil para Martins.

— Uma das imagens mais marcantes foi o dia em que abriram os portões do gramado para tomarmos sol. A cena daquelas pessoas rolando na grama nunca saiu da minha cabeça. Anos depois, voltei ao estádio, levado por meu neto, para assistir a uma partida de futebol e não aguentei ficar lá — lembra o advogado.
Além do pedido de desculpas, os homenageados receberão indenização de R$ 20 mil. Desde que foi criada em 2001, a lei 3.744, de reparação a pessoas detidas acusadas de crimes políticos, já foram pagas 650 indenizações e restam 245 até 2013.

— Em defesa da democracia, pessoas foram presas ou interrogadas dentro de um órgão do estado na presença de um agente público. Por isso, o pedido de desculpas e a indenização — explica o secretário estadual de Assistência Social e Direitos Humanos, Rodrigo Neves.

Projeto tira coronel e põe Conselheiro em nome de rua

Por Eduardo Naddar, do Globo


Se aprovada, lei vai proibir nomes de logradouros que homenageiam quem cometeu crimes contra a humanidade



Um projeto de lei, em discussão na Câmara dos Vereadores, proíbe que logradouros públicos do município recebam ou mantenham o nome de pessoas que tenham cometido crimes contra a humanidade. Entre os alvos, segundo o vereador Renatinho, autor da proposta, estão a Rua Coronel Moreira César, em Icaraí, e a Avenida General Milton Tavares de Souza, na Boa Viagem.

— Homenagear desse jeito pessoas que cometeram crimes é um péssimo exemplo — afirma Renatinho.
Apoiando a iniciativa, ativistas do movimento Ocupa Niterói realizaram, recentemente, uma intervenção na Moreira César, com cartazes explicando quem foi o coronel e propondo a mudança de nome para Rua Antônio Conselheiro.

— O coronel Moreira César derramou, direta ou indiretamente, muito sangue nas rebeliões que tentou dissolver pelo Brasil, como a Guerra de Canudos. Mas pouquíssima gente sabe isso. Nossa intenção era tirar as pessoas dessa apatia — explica a professora Sarah Nery, integrante do movimento.

Em relação à Avenida Milton Tavares de Souza, que homenageia um comandante do Centro de Informações do Exército no regime militar, o escritor niteroiense Denis de Moraes propõe como alternativa o nome da exilada política Vera Sílvia de Magalhães, torturada pelo Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi).

Outro projeto semelhante, do deputado federal Chico Alencar, pede a mudança do nome da Ponte Presidente Costa e Silva, a Rio-Niterói, para Herbert de Souza.

Dias 31/05 e 01/06: Os desafios para o enfrentamento à tortura


Na quarta, dia 30/05 - Audiência Pública: "Segurança Pública em Niterói"


Nesta segunda, às 18h30: Participe da construção do programa pelo direito à comunicação e cultura em Niterói!


sexta-feira, 25 de maio de 2012

Brasil segue jogando com futuro das florestas


Governo ignora apelos da maioria dos brasileiros e sanciona parcialmente projeto para reforma do Código Florestal. Apenas veto integral traria possibilidade de debate democrático para regulamentação da lei atual.

por Aldem Bourscheit


Brasília (DF) – O governo federal sancionou parcialmente nesta sexta (25) o projeto de novo Código Florestal aprovado pelo Congresso no fim de abril, contrariando os apelos da maioria da sociedade brasileira, de setores do próprio governo e da comunidade internacional.

Para o WWF-Brasil, apenas o veto integral ao texto possibilitaria a regulamentação da lei atual com participação real da sociedade e da comunidade científica. Sem isso, o Brasil ainda corre risco de retrocesso legislativo, pois as medidas associadas ao veto precisarão novamente do aval do Congresso, aonde ruralistas vêm tentando impor retrocessos à sociedade.

Conforme anunciaram ministros durante coletiva de imprensa esta tarde, foram vetados artigos e serão editadas medidas provisórias (MPs) para tentar recompor o projeto aprovado no Senado, como não anistiar desmatadores, preservar pequenos proprietários e a necessidade de recuperação de áreas desmatadas, manter os dispositivos das áreas de preservação permanente e das reservas legais, e a proteção a pantanais e veredas.

Todavia, nenhum texto oficial com essas medidas foi apresentado pelo governo. O conteúdo só será conhecido na segunda (28), o que denota um processo ainda pouco transparente e sem negociação.

“A sociedade brasileira e mundial assiste a um país que segue jogando com o futuro de suas florestas. O projeto aprovado no Congresso é fruto de um processo legislativo tortuoso, feito para atender apenas a uma parcela da sociedade que quer ampliar as possibilidades de desmatamento e anistiar quem desmatou ilegalmente”, ressaltou a secretária-geral do WWF-Brasil, Maria Cecília Wey de Brito.

Para a secretária-geral do WWF-Brasil, no Brasil de hoje o meio ambiente tem sempre que se subordinar a todos os outros interesses. Por isso, o país pode chegar à Rio+20 com um discurso e uma prática incompatíveis, além de uma legislação florestal indefinida.

“Fora os impactos à credibilidade e à liderança do Brasil no cenário global, poderemos sofrer barreiras comerciais por seguir crescendo de forma insustentável. Também fica a dúvida sobre como o país cumprirá suas metas assumidas internacionalmente para conservação da biodiversidade e proteção do clima”, comentou Maria Cecília.

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Governo Dilma decepciona em direitos humanos, diz Anistia Internacional


Do Estadão

O primeiro ano de governo da presidente Dilma Rousseff foi uma decepção na área de direitos humanos, segundo um relatório da ONG Anistia Internacional, divulgado nesta sexta-feira.

O documento chama a atenção tanto para tensões nas áreas rurais e deslocamentos de comunidades carentes para dar lugar às obras da Copa e Olimpíadas, quanto para o que chama de "discurso duplo" do Brasil no plano internacional.

O especialista em Brasil da ONG, Tim Cahill, explicou à BBC Brasil que, apesar de avanços como a instalação da Comissão da Verdade e as iniciativas de combate à pobreza, o governo brasileiro deixou muito a desejar em diversas frentes relacionadas a proteção dos direitos humanos.

"A violência no campo, por exemplo, sempre foi ligada a certos latifundiários e a ação de grupos ilegais. No último ano, não só esses problemas persistiram, como tivemos um aumento em um novo tipo de ameaças, associadas ao modelo de desenvolvimento econômico voltado para o crescimento, que é favorecido pelo governo."

O relatório menciona a luta de comunidades indígenas para paralisar o projeto da usina de Belo Monte, no Pará, e critica a reação brasileira à decisão da Comissão Inter-Americana de Direitos Humanos, ligada a OEA, que pediu um adiamento do licenciamento da obra em abril do ano passado.

Na ocasião, o Brasil chamou seu representante na OEA para consultas e retirou a candidatura do ex-secretário de Direitos Humanos Paulo Vannuchi a uma vaga na Comissão.
"Outro exemplo nessa linha é o aumento sem muito controle das plantações de cana para a produção de etanol, muitas vezes financiado por bancos estatais brasileiros", afirma Cahill. "Tal expansão está ligada a um aumento dos problemas de acesso a terra e, em alguns casos, exploração excessiva do trabalhador rural."

Código Florestal

Segundo o especialista da Anistia, a situação de tensão em algumas áreas rurais pode se agravar caso a presidente aprove o novo Código Florestal. O código é criticado por ONGs e especialistas por anistiar produtores que desmataram florestas nas proximidades de rios.

Cahill diz que, ao flexibilizar as regras de exploração da terra, o novo código poderia dar respaldo àqueles que exploram algumas áreas ilegalmente.

Ele elogia a aprovação, pela Câmara dos Deputados, da emenda constitucional que prevê a expropriação de proprietários acusados de usar trabalho escravo, mas faz uma ressalva: "Ainda é preciso garantir que o conceito do que é considerado escravidão não seja flexibilizado antes que as novas regras comecem a ser aplicadas."

Entre os principais problemas do ano passado nas áreas rurais, o relatório menciona as agressões contra índios Guarani-Kaiowá, no Mato Grosso do Sul, e conflitos entre fazendeiros e residentes do Quilombo de Salgado, no Maranhão.
Nas áreas urbanas, o relatório destaca os despejos de comunidades carentes por causa das obras da Copa de 2014 e da Olimpíada de 2016, principalmente no Rio de Janeiro. De acordo com Cahill, mais recentemente a organização vem recebendo denúncias de deslocamentos forçados também em Manaus e Fortaleza.

Votação sobre Síria

No plano internacional, a Anistia diz que sua maior decepção, além da resposta brasileira à decisão da OEA no caso Belo Monte, está relacionada à Síria. Em outubro do ano passado, o país se absteve, no Conselho de Segurança da ONU, na votação do projeto de resolução condenando o regime sírio pela repressão aos opositores.

"Apesar de o discurso em favor dos direitos humanos ter marcado o início do governo Dilma, está claro que ainda há uma recusa do Brasil de se envolver ativamente em políticas nessa área", diz Cahill.

O relatório da Anistia Internacional descreve 2011 como o ano em que protestos "pelo fim da tirania e injustiça" varreram o globo. A organização destaca que milhões de pessoas foram às ruas desde a Tunísia e Egito até Atenas, Nova York e La Paz para exigir melhores condições de vida.

segunda-feira, 21 de maio de 2012

Brasil precisa se comprometer, de fato, com o combate à tortura, diz advogada no Senado


A advogada da Conectas Direitos Humanos, Vivian Calderoni, informou, nesta segunda-feira (21), que o Mecanismo de Prevenção e Combate à Tortura é uma obrigação que o Brasil assumiu ao ratificar um compromisso com a Organização das Nações Unidas que estabelece a criação do Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (SNPCT).

Ela participa da audiência pública na qual está sendo debatido o Mecanismo Nacional de Proteção e Combate a Tortura (MNPCT) na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH). O projeto de lei do Executivo (PL 2442/2011) que institui o Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura ainda está em análise na Câmara dos Deputados. Em seguida virá para o Senado.

Segundo a advogada, o protocolo assinado pelo Brasil traz uma perspectiva inovadora, calcada na prevenção da tortura. O mecanismo será consolidado em um órgão nacional que terá a obrigação de fazer visitas sem aviso prévio aos lugares de detenção que mantém adolescentes, crianças e adultos privados de liberdade.

- É preciso que o Congresso aprove o mecanismo para mostrar que o país esta comprometido com a prevenção da tortura.- ressaltou a advogada. Ela acrescentou que os locais de detenção, por serem fechados, são locais que facilitam a tortura, pois as pessoas estão mais vulneráveis a maus tratos e violações de direitos humanos dificilmente denunciados.

Agência Senado

Dados sobre violações do Estado aos direitos humanos agora são públicos


São Paulo – Com a Lei de Acesso à Informação, que no último dia 16 (quarta-feira) passou a vigorar em todo o país, a população brasileira passa a ter assegurado o direito de solicitar qualquer tipo de informação sobre a administração pública aos órgãos competentes, desde que a solicitação não esteja em documentos classificados como sigilosos.

Segundo Inês Soares, procuradora da República do Ministério Público Federal em São Paulo, os dados sobre violações aos direitos humanos cometidos pelo Estado estão fora dessa restrição e, portanto, têm de ser disponibilizados para qualquer cidadão que os solicite. 

Para a procuradora, daqui em diante o exercício desse direito vai depender da prática da sociedade, que precisa se habituar a acompanhar os dados disponibilizados pelo poder público, e da organização dos próprios órgãos públicos para fornecer a informação de acordo com o que manda a lei.

Confira a entrevista concedida à Rádio Brasil Atual.

A lei assegura que a população vai ter acesso às informações sobre violação dos direitos humanos, mas primeiro não é preciso abrir os arquivos da ditadura militar?

Pois é. Os arquivos estarão incluídos quando houver violação a direitos humanos, porque nem todos os documentos que estão nesses arquivos da ditadura são relativos à violação dos direitos humanos. Mas quando houver violação de direitos humanos há previsão legal que o acesso seja imediato. Agora, isso talvez ainda gere alguma discussão porque a lei também trata de documentos sigilosos, então será preciso compatibilizar os dois dispositivos legais.

E quais são esses documentos sigilosos que continuam cerrados à consulta popular?

O sigilo pode ser para documento reservado por cinco anos, para documentos secretos, por 15, e para ultrassecretos, por 25, mas em qualquer dessas situações o Estado tem obrigação de publicar anualmente um rol com todos os documentos com título e o tema. A pessoa não pode ver o conteúdo, claro, se é sigiloso, mas poderá saber do que se trata.

A sra. considera que essa lei vai contribuir para as investigações da Comissão da Verdade?

Sim. Eu acho que essa lei é super importante. Foi bem propício que ela tenha sido promulgada junto, no mesmo dia inclusive da lei que cria a Comissão da Verdade. Uma lei reforça a outra, a lei de acesso à informação vai instrumentalizar o trabalho da Comissão da Verdade, além de possibilitar todo acesso às violações humanas. Mesmo quando o documento é sigiloso há previsão legal que ele pode ser disponibilizado em algumas situações para os trabalhos da Comissão da Verdade e as pessoas que tiverem acesso a essa documentação ficam com a obrigação de manter o sigilo. Então, eu acho que a lei vai ajudar muito nesse sentido.

Os órgãos públicos tem um mês para dar a resposta. E se não o fizerem? 

Além da previsão do prazo de um mês, há também a previsão de responsabilização dos agentes públicos que não derem a resposta, e também se a resposta for negativa, porque pode muito bem durante esse prazo o cidadão que pede resposta ter uma recusa do seu pedido, né? Então, a lei além de prever responsabilidade para o funcionário que não der a resposta, prevê também recursos em prazo de cinco dias para o cidadão que não se conforma com aquela resposta negativa de acesso aos documentos.

E como o Ministério Público Federal pode garantir que a população tenha acesso de fato a essa informação? 

Na verdade, essa lei trata de um direito fundamental como tantos outros que o Ministério Público já acompanha no caso de não cumprimento ou de algum tipo de violação aos direitos, então não há necessidade a princípio de uma força-tarefa para isso. Pelo menos é o entendimento até agora do Ministério Público Federal, na Procuradoria de São Paulo. No caso de violações, eu acho que primeiro a gente precisa começar a exercitar esse direito e ver quais são as falhas, né? O Ministério Público, nesse caso, vai atuar depois. Atuou preventivamente, contribuindo na redação da lei, dando contribuições ao projeto de lei, mas agora é esperar a implementação mesmo.

OAB-RJ apoia projeto de lei que batiza de Betinho nome da ponte Rio-Niterói


O presidente da OAB do Rio de Janeiro (OAB-RJ), Wadih Damous considerou hoje (21) “ um marco histórico, um legado à cidadania, à democracia com justiça social e ao resgate da verdade e da memória”, o projeto de lei 3388, de 2012, de autoria do deputado federal Chico Alencar (Psol-RJ) que dá à ponte Rio-Niterói o nome do sociólogo Herbert de Souza, mais conhecido como Betinho, no lugar de Presidente Costa e Silva. Segundo Damous, a mudança é fundamental dentro do contexto da instalação da Comissão da Verdade, como mais uma forma de “passar a limpo muitos aspectos da nossa história recente, sem revanchismos, mas com senso de justiça e de verdade conosco mesmos, nossos filhos e netos”. 

- Costa e Silva lembra o período da ditadura. Lembra o período mais obscuro da história do Brasil. Betinho lembra liberdade e solidariedade, esperança para o Brasil, afirmou Damous. Para ele, é inaceitável que a popularmente chamada Ponte Rio-Niterói seja oficialmente denominada Ponte Presidente Costa e Silva, em homenagem a um chefe de Estado que foi um dos artífices do golpe militar, responsável por momentos dos mais sombrios da história brasileira como o que se inicia com a edição do famigerado Ato Institucional nº 5 (AI-5). 

A proposta de alteração da denominação da ponte Rio-Niterói, localizada do Km 321 ao 334, na BR 101, teve origem, segundo o deputado Chico Alencar, na solicitação de vários movimentos de direitos humanos encaminhadas aos membros da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, em dezembro de 2011. Propõe nova denominação à ponte presidente Costa e Silva (Rio-Niterói) para ponte Herbert de Souza – Betinho (1935 – 1997), que dedicou sua vida à luta pela democracia e pela justiça social.

 A Lei nº 6.682, de 27 de agosto de 1979, dispõe sobre a denominação de vias e estações do Plano Nacional de Viação – PNV, estabelece em seu art. 2º que qualquer via pública “poderá ter, supletivamente, a designação de um fato histórico ou de nome de pessoa falecida que haja prestado relevantes serviços à Nação ou à Humanidade”. Além disso, O terceiro Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3) prevê que não mais sejam homenageados, a partir do batismo de logradouros públicos com seus respectivos nomes, indivíduos que notadamente tenham cometido crimes e perpetrado violações dos direitos humanos no período da Ditadura Civil Militar de 1964-1985.   

Diante dos fatos apresentados, o deputado Chico Alencar decidiu acolher a argumentação dos vários movimentos de direitos humanos que lutam pela alteração da denominação da mais famosa ponte do Rio de Janeiro. “Homenagear a ditadura é torturar a memória; homenagear Betinho é fazer justiça”!, destacou o parlamentar. A escolha do nome de Betinho, deve-se à sua incansável luta pelos direitos humanos no período ditatorial, e pela sua condição de símbolo dos exilados e da anistia. Retornando ao país, Betinho empenhou-se pela dignidade das populações vulneráveis com a criação do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas – IBASE, em 1981, além do lançamento da Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida em 1993, tendo recebido, inclusive, indicação ao Prêmio Nobel da Paz. < span style="line-height: 115%; font-size: 16pt;"> 

Betinho nasceu em Bocaiúva, em Minas Gerais, no dia 3 de janeiro de 1935 e morreu no Rio de Janeiro em 9 de agosto de 1997. Foi o quarto filho de uma família de oito irmãos, entre os quais o cartunista Henfil e o músico Chico Mário. Sua infância foi marcada por fatos incomuns. Já nos primeiros dias de vida, teve hemofilia, uma doença no sangue que impede a coagulação. Herbert de Sousa começou a sua militância política na Juventude Católica, em Belo Horizonte. Estudou na Universidade de Minas Gerais e formou-se em sociologia em 1962. Depois do golpe militar de 1964, Betinho engajou-se na resistência contra a ditadura. Passou sete meses no Uruguai e depois, de volta ao Brasil, foi trabalhar como operário na cidade paulista de Mauá. 

Em 1971, Herbert de Sousa partiu para o exílio. Morou em diversos países. No Chile, deu aulas na Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais e assessorou o presidente Salvador Allende, deposto em 1973 pelo general Augusto Pinochet. Escapando da ditadura chilena, Betinho exilou-se no Canadá e depois no México. Fez doutorado e foi professor na Universidade Autônoma do México. Com a anistia política, em 1979, retornou ao Brasil. Tornou-se um dos símbolos da resistência política. Dois anos depois, fundou o IBASE (Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas). Em 1990, o movimento Terra e Democracia, que Betinho liderava, reuniu no Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro, milhares de pessoas para lutar pela democratização da terra. 

Herbert de Sousa teve confirmado o diagnóstico de sua contaminação pelo HIV, o vírus causador da Aids, em 1985, contraído numa de suas inúmeras transfusões de sangue no tratamento da hemofilia. No ano seguinte, fundou a ABIA, uma associação para lutar pelos direitos das pessoas portadoras do HIV ou dos doentes com Aids. Betinho dirigiu essa organização por onze anos. A doença atingiu também sua família: no período de um ano, Betinho perdeu dois irmãos vítimas da Aids. A maneira de lidar com a doença foi falar sobre ela. Herbert de Sousa iniciou uma grande campanha nos meios de comunicação para esclarecer as pessoas sobre a doença.  

Em 1992, Betinho liderou o movimento pela Ética na Política, que culminou com o impeachment do então presidente Fernando Collor, em setembro do mesmo ano. Esse movimento plantou os alicerces do movimento Ação da Cidadania contra a Miséria e pela Vida. A partir da participação de Betinho, o problema da fome e da miséria tornou-se visível e concreto para todos os brasileiros. Herbert de Sousa abriu várias frentes de trabalho, principalmente no seu relacionamento com a mídia. Em 1993, foi considerado "homem de ideias do ano", pelo Jornal do Brasil. 

Depois de muito lutar contra a doença, Betinho faleceu em 1997, aos 61 anos, em sua casa, no bairro do Botafogo.