Por: Redação da Rede Brasil Atual
São Paulo – O Poder Judiciário da Argentina avalia um caso que pode envolver María Elena Vázquez de Astiz, mãe do “Anjo da morte”, uma das figuras mais sombrias da última ditadura (1976-83), ao roubo de bebês.
O caso em apuração ocorreu em 1977, quando María e seu marido ofereceram a um pedreiro de Mar del Plata uma criança. Em depoimento, o homem contou que a proposta foi feita após o casal tomar conhecimento de que sua mulher não podia engravidar. Além disso, María disse a ele se tratar do filho de sua empregada doméstica, que não tinha condições de sustentar o bebê.
“Não se pode desvincular isso da relação que une a processada a Astiz. Para a Justiça, esta questão não é indiferente”, diz o fiscal Claudio Kishimoto em entrevista ao jornal Página12 de hoje (8). Uma das possibilidades é de que a criança tenha sido roubado da Escola Superior de Mecânica da Marinha (ESMA, na sigla em castelhano), maior centro de tortura do regime. “No momento dos fatos, Alfredo Astiz dava revista na ESMA e não podemos suprimir a possibilidade de que o Estado investigue esta questão, na qual há fortes indícios de que possa se tratar de um caso de lesa-humanidade.”
A investigação impede María de deixar o país. Mesmo que não se comprove a ligação com o roubo de bebês durante a ditadura, o fato de a identidade da filha do pedreiro ser até hoje desconhecida resulta em um crime continuado, o que, obviamente, se veria agravado pela comprovação do vínculo com a ESMA. O sequestro de crianças de militantes políticos detidos nos centros de tortura foi uma das práticas sistemáticas do regime autoritário, responsável pela morte de 30 mil pessoas. Entre os militares, era ideia comum a de que se tratavam de herdeiros de um sangue “subversivo” que, em posse de “famílias de bem”, poderiam ser salvos.
No ano passado, Astiz foi condenado à prisão perpétua por sua atuação na ESMA. O “Anjo da morte” se transformou em uma das figuras mais sombrias da ditadura ao criar laços de amizade com o grupo que viria a se transformar nas Mães da Praça de Maio, símbolos da resistência ao regime. Após ganhar a confiança das senhoras, Astiz denunciou as reuniões que se realizavam em uma igreja de Buenos Aires. Na ação foram detidas Azucena Villaflor, que logo seria morta, e duas freiras francesas atiradas ao mar, outro operativo recorrente dos repressores, em uma prática mais tarde conhecida como “voos da morte”.
Também no ano passado, o Página12 revelou documentos que mostraram a atuação da diplomacia brasileira para livrar Astiz da cadeia na Europa após a derrota argentina na Guerra das Malvinas. O trabalho do Itamaraty reforçou a existência de vínculos entre os regimes ditatoriais por meio do Plano Condor, instrumento de comunicação e colaboração dos governos autoritários do Cone Sul.
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