segunda-feira, 26 de março de 2012

Jean Wyllys pede ao prefeito Eduardo Paes que se posicione contra projeto que proíbe a divulgação de material contendo orientações sobre a diversidade sexual

Veja abaixo ofício enviado pelo deputado Federal Jean Wyllys (PSOL/RJ) ao prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PMDB/RJ), acerca do projeto de lei 1082/2011, do vereador Carlos Bolsonaro (PP), que “veda a distribuição, exposição e divulgação de material didático contendo orientações sobre a diversidade sexual nos estabelecimentos de ensino fundamental e de educação infantil da rede pública municipal da cidade do Rio de Janeiro”.

O projeto, já conhecido como Lei do Bullying, esclarece que o material proibido será “todo aquele que, contenha orientações sobre a prática da homoafetividade, de combate à homofobia, de direitos de homossexuais, da desconstrução da heteronormatividade ou qualquer assunto correlato”.

Aprovado por 21 votos contra 9 na Câmara dos Vereadores, o projeto terá uma segunda votação, que ocorrerá amanhã, 27, na Câmara dos Vereadores. Caso seja aprovado, explica o deputado, isso significará um aval do estado municipal à violência, ao bullying, à discriminação e ao preconceito.

O deputado, como defensor dos Direitos humanos e representante do povo do Rio no Congresso Federal, pede ao prefeito que se posicione publicamente contra o projeto, dê orientações à bancada do seu partido para rejeitá-lo e se comprometa a vetá-lo se for aprovado. O deputado também convoca a sociedade a se mobilizar à Câmara para reclamar que essa lei seja rejeitada.

Câmara dos Deputados
Gabinete do Deputado Jean Wyllys PSOL/RJ

Ofício no. 71/2012

Exmo. Sr. PrefeitoEduardo Paes,

Eu, Jean Wyllys, como cidadão brasileiro homossexual e deputado federal que defende os
direitos humanos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transgênero (LGBT), entre outras
causas, venho por meio desta dizer que me sinto afrontado com o projeto de lei 1082/2011, do
vereador Carlos Bolsonaro (PP), que “veda a distribuição, exposição e divulgação de material
didático contendo orientações sobre a diversidade sexual nos estabelecimentos de ensino
fundamental e de educação infantil da rede pública municipal da cidade do Rio de Janeiro”. O
projeto ainda esclarece que o material proibido será “todo aquele que, contenha orientações
sobre a prática da homoafetividade, de combate à homofobia, de direitos de homossexuais, da
desconstrução da heteronormatividade ou qualquer assunto correlato”.

O projeto, já conhecido como Lei do Bullying, foi aprovado por 21 votos contra 9 na Câmara
de Vereadores da nossa cidade e terá uma segunda votação nessa terça-feira 27. O Rio ainda
está a tempo de impedir que essa afronta à democracia seja aprovada. Por isso, como cidadão
carioca, ativista de direitos humanos e representante do povo do Rio no Congresso Federal,
venho pedir a V. E. que se posicione publicamente contra esse aberrante projeto, dê
orientações à bancada do seu partido para rejeitá-lo e se comprometa a vetá-lo se for
aprovado.

Não podemos deixar passar esta gravíssima tentativa de institucionalizar a homofobia e o
bullying como políticas públicas, condenando aos nossos jovens gays e lésbicas à humilhação,
o desrespeito, a discriminação e a violência. Não podemos permitir que se proíba ao Estado
fazer o que a Constituição Federal e todos os tratados internacionais de Direitos Humanos lhe
mandam. Não podemos aceitar que a ignorância, o preconceito e a violência contra as minorias
se tornem lei na nossa cidade!

Nós, gays e lésbicas, não nascemos adultos. Como todas as outras pessoas, temos infância e
adolescência, mas, produto de todos os males que esse projeto busca reforçar, nossa infância
e adolescência é, na maioria dos casos, muito difícil. Assim que começamos a exteriorizar
nossa orientação sexual, sofremos as injúrias, o acosso, as piadas, as ameaças e a violência
de alguns dos nossos colegas, às vezes inclusive da nossa família e dos nossos amigos.
Isso, muito frequentemente, acontece sem que exista intervenção dos adultos — nossos pais,
nossos professores, as autoridades — para nos proteger. Muitas vezes nos sentimos sós.
Estamos sós.

Eu fui uma criança gay e sei muito bem como a homofobia leva à violência. E como dói, como
magoa! O escritor argentino Osvaldo Bazán o explica muito bem:

A criança judia sofre a estupidez do mundo, volta para casa e lá seus pais judeus lhe
dizem: “estúpido é o mundo, não você”. E lhe dizem por que essa noite não é como
todas as noites, e contam para ele a história daquela vez em que tiveram que sair
correndo e o pão não fermentou. Dão-lhe uma lista de valores e falam: “Você está
parado aqui”. E saberá a criança judia que não está sozinha. A criança negra sofre a
estupidez do mundo, volta para casa e lá seus pais negros lhe dizem: “estúpido é o
mundo, não você”. E lhe falam do berço da humanidade, de um barco, de uma guerra.
Dão-lhe uma lista de valores e falam: “Você está parado aqui”. E saberá a criança negra
que não está sozinha. A criança homossexual sofre a estupidez do mundo e nem pensa
em falar com os pais, porque supõe que eles vão ficar chateados. Não sabe por quê,
mas eles vão se chatear. E para seus pais, o pior é crer que seu filho não é como eles
(…). A criança homossexual, só por ter nascido homossexual, só por ter sido parida em
território inimigo, está em guerra com a religião, com a ciência e com o Estado. Como
poderá uma criança enfrentar uma luta tão desigual?

A escola não pode fechar os olhos e tratar essas crianças e jovens como se não existissem.
Não pode abandoná-las, deixá-las sozinhas. O projeto do vereador Bolsonaro, se aprovado,
significará um aval do estado municipal à violência, ao bullying, à discriminação e ao
preconceito. Tudo isso que o Estado deveria combater passará a ser política do Estado.

O senhor sabe, prefeito, que é objetivo fundamental da República Federativa do Brasil reduzir
as desigualdades sociais, conforme está expresso no inciso III do artigo 3º da Constituição
Federal. Sabe também que, entre os brasileiros, é garantida a plena igualdade (artigo 5º, caput,
da mesma Constituição). Além de superar as injustiças socioeconômicas entre as diferentes
classes sociais, o mandato constitucional inclui também que devemos romper com estigmas
que pesam contra determinados grupos culturais e de identidade que compõem a sociedade
brasileira, que por vezes padecem de exclusão simbólica. Como tal desiderato demanda
políticas públicas para sua efetivação, a proposição em comento — que explicitamente as
proíbe — não pode ser aceita.

O Rio de Janeiro não se espelha no projeto do vereador Bolsonaro. Nossa cidade maravilhosa
tem dado, nos últimos anos, claras demostrações de que quer ir na direção contrária à que ele
propõe. Somos uma cidade que quer celebrar a diversidade e construir a igualdade, acabar
com o preconceito e festejar a união, garantir direitos e combater a violência. É nesse Rio de
Janeiro que eu acredito, e sei que V. E. também. O projeto aprovado pela Câmara é, também,
um golpe contra as políticas públicas que o seu próprio governo, através da Coordenadoria
Especial da Diversidade Sexual, desenvolve — políticas que eu, mesmo militando na oposição,
tenho elogiado.

Se aprovada, a Lei do Bullying envergonhará o Rio de Janeiro — e todos nós — diante do
mundo inteiro! Nossa cidade será notícia na imprensa internacional por ter legalizado a
homofobia. Nós, cariocas, não merecemos isso.

Conto com V. E. para determos juntos essa loucura.

Sem mais, agradeço sua gentileza em receber esta minha carta já que uma conversa entre nós
não foi possível por motivos de agenda.

Jean Wyllys
Deputado Federal PSOL-RJ

Nenhum comentário:

Postar um comentário