domingo, 6 de novembro de 2011

No Rio, os canhões apontados no alvo do Morro do Alemão contrariam a Constituição


Por Mauricio Dias, na Carta Capital

Pela quarta vez consecutiva foi renovado o acordo oficial entre a União, via Ministério da Defesa, e o governo do Rio de Janeiro, prolongando a presença do Exército no indigitado e célebre Morro do Alemão. Pela quarta vez, também seguidamente, essa decisão sustentada pelo aplauso dos cariocas, assustados pelo poder paralelo dos traficantes, manda às favas a Constituição. E, pela primeira vez, o ministro da Defesa, Celso Amorim, digere o prato feito preparado por Nelson Jobim, antecessor dele na pasta.
A onda de violência que deprime os cariocas vem de longe. E, a partir de então, a população cede aos caprichos dos governantes por essa circunstância.

Anteriormente, nos anos 1960, louvaram, ostensiva ou silenciosamente, a matança de mendigos que amanheciam boiando no fétido Rio da Guarda, na Baixada Fluminense. Posteriormente, sentiram-se seguros quando emergiu no noticiário policial o tristemente famoso Esquadrão da Morte, formado por policiais que expressavam um princípio ainda em vigor: “Bandido bom é bandido morto”.
Mataram muitos: Mineirinho e Cara de Cavalo. Surgiram outros. Hoje em dia, Elias Maluco e Fernandinho Beira-Mar. Mais implacáveis e mais violentos no comando de facções armadas, enfrentam agora os militares e seus canhões.
A presença do Exército no Alemão é a confissão, não oficial, da falência da segurança pública que é uma atividade peculiar de cada estado da federação.
O emprego dos militares na preservação da ordem pública, segundo especialistas, é medida somente recomendável quando houver decretação do estado de defesa ou do estado de sítio. Assim também concluiu o Estado-Maior do Exército no simpósio As Forças Armadas e a Segurança Pública, realizado em maio de 2007.
A atuação das Forças Armadas, na garantia da ordem pública, invadiu a pauta de -discussões da reunião do Ministério -Público Militar, em Brasília, entre os dias 9 e 11 de novembro.
O uso do Exército na Garantia da Lei e da Ordem (GLO, no jargão militar) é previsto na Constituição. Nesses casos ela estabelece um ritual: a intervenção federal por meio de decreto do presidente da República, que comunicará o Congresso Nacional em até 24 horas. É o que legalizaria a atuação dos militares no Morro do Alemão.
Através dessa porta arrombada entrou, na semana passada, o despacho da juíza Renata Palheiro Mendes. Ela expediu mandados de busca e apreensão, no Alemão, solicitados pela Força de Pacificação. Os especialistas já condenaram a expedição de mandado de busca domiciliar genérico, como -ocorreu nesse caso.

Esse remédio usado no Morro do Alemão não seria usado na zona sul carioca.
Além desse flagrante desequilíbrio da lei aplicada no morro e não nos bairros elegantes da cidade, há outra irregularidade percebida na decisão. Pelas regras do convênio entre a União e o governo fluminense, nenhum oficial das Forças Armadas tem atribuição de requerer mandado de busca e apreensão junto ao Judiciário estadual.
Uma ilegalidade sucedeu à outra. E a soma desses dois erros não configura acerto. Ao contrário. São duas flagrantes ilegalidades.

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