domingo, 6 de novembro de 2011

A Ocupa Rio já conta mais de 100 barracas fincadas na Cinelândia no fim da primeira semana


por Artur Romeu, na Vírus Planetário

Um pólo de efervescência política e cultural brotou das pedras portuguesas  da Praça da Cinelândia, no coração do centro comercial do Rio de Janeiro. Inspirada nos movimentos de ocupação de Wall Street, em Nova York, na acampada do 15 de Maio, em Madrid, e na revolução da Praça Tahrir, no Cairo, os novos moradores da Avenida Rio Branco número 0 se fortalecem a cada minuto. No último sábado, o primeiro dia da acampada, pouco mais de vinte barracas foram montadas e mal havia sido definida uma infra-estrutura e logística para os próximos dias da manifestação que já se propunha permanente. Hoje são mais de 100 barracas organizadas por setores. Foi montado um centro de mídia e comunicação, energizado por uma bicicleta ligada a duas baterias, foram plantadas cinco hortas urbanas, ao redor dos canteiros das árvores da praça, e estabeleceu-se um espaço para alimentação, onde são servidas três refeições diárias na base de pequenas doações.
A principal exigência da sociedade ao deparar-se com o movimento é conhecer a pauta de reivindicações políticas de forma concreta, assim como entender o porque da ocupação permanente da praça pública. Esses questionamentos muitas vezes são feitos de forma crítica ao movimento, argumentando que sem a existência de campanhas estabelecidas toda a proposta dos manifestantes se perde na efemeridade ou simplesmente na rebeldia sem causa.
Como não existem lideranças ou porta vozes da Ocupa Rio, já que uma das premissas é a pluralidade de opiniões e a horizontalidade na constituição do movimento fica ainda mais difícil captar de forma clara a mensagem que está sendo passada. No entanto, ao fim da primeira semana, alguns objetivos já podem ser ressaltados como principais características  da ocupação. A minha leitura é que existem pelo menos três vertentes essenciais para se entender a dinâmica e o processo da criação daquele espaço.
O primeiro é a busca de pontos de convergência através do debate político. Como a pluralidade ideológica é um dos pilares da Ocupa Rio, a criação de um espaço permanente de reflexão sobre a sociedade e o sistema de governança atual se torna fundamental enquanto processo de auto formação e da tomada de consciência dos problemas sociais que atingem o mundo hoje para o amadurecimento individual e coletivo no movimento.
Outra característica é a experimentação de novos modelos de organização social comunitária. A ocupação é cada vez mais um laboratório para a construção de um sistema político mais justo e integrado. As decisões são feitas por consenso e a percepção dos ocupantes de que cada um tem um papel a desempenhar e responsabilidades a cumprir para o bom funcionamento do espaço é muito presente – seja na hora de cozinhar, lavar, limpar ou debater, criar e agir.
Mais uma vertente importante é o estímulo de ações práticas para ampliar as questões discutidas no seio do acampamento para o resto da sociedade. As oficinas realizadas são uma das principais formas de levar a mensagem para os curiosos que passam diariamente pela praça. Dinâmicas de yoga e meditação, rodas abertas de debates sobre questões como a usina de Belo Monte, um microfone aberto para leituras de poesias e denúncias de problemas sociais, e experiências mais lúdicas, como o “Choque de Amor”, realizado na sexta-feira a tarde, no qual os ocupantes convidavam os passantes para um abraço coletivo, vão moldando aos poucos a cara da ocupação.
Ainda assim, a melhor maneira de conhecer o movimento é passar pela Cinelândia entre as 17h e 20h, quando o número de atividades cresce e os debates afloram. A troca com os comerciantes locais e mesmo o entendimento com a polícia municipal que circula constantemente pelo local tem se feito de forma cordial. Não houve ainda nenhum confronto ou incidentes. Mas os desafios ainda são muitos. Como continuar crescendo, manter o esquema de alimentação gratuito e viralizar as discussões políticas da ocupação para o resto da sociedade para que haja formas de pressões concretas e mudanças reais no sistema ainda estão sendo definidas.
A Ocupa Rio é composta essencialmente por duas instâncias de organização e tomada de decisão. Os grupos de trabalho (GTs) contam com um número reduzido de pessoas e foram pensados para agilizar o desenvolvimento prático da acampada. Por exemplo, existe o GT de reciclagem, cujo o objetivo é gerenciar a emissão de lixo da praça; ou o GT de segurança, que organiza turnos de vigília durante o dia e a noite; ou ainda o GT de teoria, que se propõe a debater questões mais amplas que serão levadas em seguida ao resto dos grupos e pautar uma linha de pensamento política da acampada.
A outra instância, de certa forma o coração do movimento, é a Assembléia Geral. Esse é o espaço no qual são feitos os informes diários do andamento dos GTs e são mastigadas decisões mais polêmicas, assim como definidos os futuros passos da ocupação. As decisões são tomadas por consenso, por isso o processo pode parecer lento e repetitivo para quem está de fora do dia-a-dia da acampada. Na Assembléia também são levantados pontos que podem sugerir a criação de novos grupos de trabalho, a organização de atividades culturais e o desenvolvimento de novos espaços e infra-estrutura.
A energia da Ocupa Rio é contagiante. Rodas de capoeira e de samba se confundem com as de debate sócio-político; oficinas de desenho e de construção com bambu se misturam com as de plantações de horta e treinos de slekline. Os participantes são anarquistas, vegetarianos, comunistas, estudantes, moradores de rua, favelados, hackers, crianças, gringos, jovens, coroas e por aí vai. Independente das motivações de cada um dos acampados, a criação de laços de amizade, o fluxo constante da troca de idéias e a preocupação com a sociedade, assim como a crença de que o mundo melhor para todos é possível (e algo pelo qual vale a pena lutar) é bonito de se ver.

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