domingo, 12 de fevereiro de 2012

Unir os trabalhadores em solidariedade à greve das polícias e bombeiros e contra o Estado Policial de Cabral!

"Os direitos se tomam, não se pedem;
se arrancam, não se mendigam."
(José Martí)


O Núcleo Frei Tito de Direitos Humanos, Comunicação e Cultura do PSOL vem, por meio deste documento, colocar-se ao lado da greve dos policiais e bombeiros do estado do Rio de Janeiro, deflagrada desde o dia 10 de fevereiro de 2012.

Entendemos que a luta desses servidores por melhores salários é justa e necessária. Um alento para todos os cidadãos que se indignam com a corrupção infelizmente presente nessas corporações. Sinal do inconformismo de boa parte desses profissionais com um sistema que empurra parcelas expressivas das corporações policiais para o exercício de atividades informais de segurança privada ou mesmo para práticas criminosas. Muito pior que a greve seria a silenciosa submissão à disciplina militar, que convive hipocritamente com a associação de policiais ao comércio varejista de drogas, de armas, grupos de extermínio e milícias.

A luta dos grevistas por melhores condições de trabalho deve questionar o próprio modelo militarista e belicista de segurança pública. A opção pelo modelo militar teve no Brasil um duplo sentido: sujeitar os policiais a uma dura hierarquia que subordine corporações formadas por contingente de profissionais com baixa remuneração, bem como forjar uma honra corporativa que faz do policial um sujeito estranho e oponente das classes populares, mesmo tendo sua origem nela. Em outras palavras, o modelo militar foi a fórmula encontrada pelas elites políticas e econômicas de programar tais corporações, alistadas dentre indivíduos pertencentes à base da pirâmide social, para reprimir seus semelhantes. Recebem uma mínima compensação salarial para se submeterem a um regime de disciplina, hierarquia e obediência sem contestação, pronto para combater a rebeldia e a criminalidade das camadas populares. 

A vedação constitucional à sindicalização e à greve de policiais e bombeiros é reveladora do esforço das elites em impedir a identificação desses profissionais com o povo, em obstaculizar que se compreendam também como trabalhadores. Essa é justamente a mensagem mais fecunda dessa greve — observar que servidores da segurança pública e defesa civil para reivindicar seus direitos são obrigados a lançar mão de instrumentos e métodos da luta e organização dos trabalhadores, e que dependem do apoio popular para enfrentar a manipulação da grande mídia e a truculência do governo Cabral. Trata-se de uma inegável chance para que um crescente número de policiais perceba e rejeite o caráter eminentemente político e elitista da política de segurança pública, expressa na rotina de extermínio do BOPE, nas megaoperações policiais, no Caveirão, nos autos de resistência, no mandado de busca e apreensão genérico, nas barreiras acústicas, na criminalização dos movimentos sociais e manifestações culturais da favela. E também em operações como a que removeu violentamente a ocupação de Pinheirinho em São José dos Campos (SP), o que em dimensões diferentes se repete na cidade do Rio de Janeiro em decorrência das obras de infraestrutura para a Copa do Mundo e Olimpíadas.

Isso sem falar nas Unidades de Polícia Pacificadora. As UPPs são projeto de cidade, não de segurança pública. Quase todas as UPPs se situam em localidades de interesse da especulação imobiliária, da rede hoteleira ou em lugares em que estão previstas obras para os megaeventos. Trata-se de modelo segregador de segurança pública para regiões de interesse do capital, um programa que não garante os direitos à população de favela, mas, sim, o terreno livre, pronto para investimentos e negócios. Não por acaso, não há UPPs em áreas de milícias. Não se negocia liberdade em troca de mais segurança.

Portanto, está na raiz do problema o próprio modelo militar de segurança pública, cuja orientação é infundir confiança às classes dominantes e criminalizar a pobreza e os movimentos sociais, com o suporte da polícia que mais mata e morre no mundo. Ao reivindicar salários justos, os policiais e bombeiros descortinam a própria crise do modelo militarista de segurança pública, que criminaliza a pobreza, reprime as manifestações em prol de melhores condições de vida ao trabalhador e submete policiais a uma cultura autoritária, extremamente funcional à lógica de precarização de direitos. 

Nas mobilizações dos bombeiros em 2011, o Rio de Janeiro se vestiu de vermelho para apoiar as manifestações por aumento salarial da categoria. Na ocasião, a população venceu seus preconceitos, reiterados à exaustão pelas classes dominantes e pelos grandes veículos de comunicação, ao reconhecer a legitimidade da luta desses servidores públicos por melhores condições de trabalho. É hora novamente dos cidadãos do estado do Rio de Janeiro demonstrarem coragem para não sucumbir à chantagem e manipulação de um governador que rejeita qualquer negociação com as categorias em greve. Ao invés disso, o governo promove a prisão das lideranças do movimento, confinando-as ilegalmente em Bangu 1. Repete-se assim a velha tradição brasileira de tratar problemas sociais como caso de polícia, agora com a aquiescência da Presidenta Dilma, que declarou que anistia a policiais grevistas cria um país sem regras. Algo muito decepcionante de ser ouvido de uma ex-presa política que desafiou com a própria vida leis autoritárias da ditadura civil-militar brasileira.

Há milhares de policiais honestos, que arriscam suas vidas apesar dos salários indignos. Eles são as primeiras vítimas do padrão militarista de segurança pública. Precisamos reivindicar com urgência um novo paradigma de justiça criminal e de Estado, no qual a atividade policial esteja subordinada a uma ampla proposta de realização da justiça social e dos direitos humanos, o que passa obrigatoriamente pela desmilitarização dos bombeiros e da polícia. Depende igualmente da garantia de salários dignos para esses trabalhadores, como também de uma formação profissional comprometida com a defesa da vida e do bem coletivo. A complexidade da gestão da segurança pública e defesa civil exige dedicação exclusiva dos servidores públicos responsáveis por zelar pela segurança, proteger direitos e liberdades da população. Mas essa exigência se torna inócua quando o Estado não garante uma remuneração justa para policiais e bombeiros. Todo apoio à luta dos trabalhadores! Salários dignos e anistia já!


Niterói, 12 de fevereiro de 2012.
Núcleo Frei Tito de Direitos Humanos, Comunicação e Cultura do PSOL

Um comentário:

  1. Muito bem! Apoio esta tese de fundamental importancia, que esclarece á criminalização dos trabalhadores das forças auxiliares da polícia militar, que antes de serem instrumentos de repressão historicamente com raízes coloniais e de origem do absoluismo francês implantado pelo positivismo da coroa portuguesa;antes de tudo são os bons profissionais chefs de família, que acreditaram numa ideologia errada e hoje pagam um alto preço. vilma

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